segunda-feira, 1 de abril de 2013

Fiel que se disse enganado por igreja não ganha ações

Fiel que se disse enganado por igreja não ganha ações


Por Camila Ribeiro de Mendonça



Um lavador de carros, que acusou a Igreja Universal do Reino de Deus de incentivá-lo a pedir empréstimo para repasse ao templo com a falsa promessa de que ganharia milhões em um processo trabalhista, não se deu bem na Justiça. Ele moveu duas ações contra a igreja. Em nenhuma delas, o fiel conseguiu provar que foi induzido pelos religiosos a contrair dívida. Além de acusar a Igreja de forçá-lo a fazer a doação, o lavador de carros reclamou que, como não tinha o dinheiro, ficou com uma dívida que está muito além de suas possibilidades.



Em uma das ações, ele alegou que os bispos da Iurd o convenceram a pegar empréstimos para fazer doações altas. Em troca, fariam orações para que ele ganhasse uma ação trabalhista. O lavador de carros argumentou que foi convencido de que se tratava de uma causa milionária, o que o levou a pedir um empréstimo no valor de R$ 1 milhão. No término do processo trabalhista, o autor recebeu somente R$ 12, 5 mil, valor insuficiente para quitar a dívida. O título foi levado a protesto e ele ficou com nome sujo na praça.



Na petição inicial, alegou ter sido enganado pela Universal. Afirmou que a igreja se aproveitou de sua simplicidade e da situação financeira e emocional do momento. Pediu na Justiça indenização de R$ 1.582.019,60, valor referente aos empréstimos tomados por ele, bem como de R$ 250 mil por danos morais. Ao todo, atribuiu à causa o valor de R$ 1.832.019,60.



Para a juíza Fernanda Gomes Camacho, da 6ª Vara Cível do Foro Central de São Paulo, o autor não conseguiu comprovar que a ré o induziu ao empréstimo e recebeu tal quantia. Pesou na decisão o fato de não haver contrato firmado entre as partes, nem prova de que os valores emprestados pelo autor tivessem sido entregues à ré. Para ela, as provas testemunhais são insuficientes por tratar-se de um valor tão elevado. E ainda: o cadastro negativo do nome do autor é muito anterior à data dos protestos do empréstimo.



No outro processo, dessa vez contra bispos e pastores, o lavador de carros pediu a condenação deles ao pagamento de indenização por danos materiais no valor de R$ 385 mil e de danos morais na quantia de R$ 15 mil.



Consta dos autos que ele conheceu dois pastores Fagner e, após certo tempo, eles teriam dito ao autor que deveria investir na Igreja para conseguir seu objetivo, ganhar a ação trabalhista, pois com a doação estaria demonstrando confiança e fé.



Como o lavador não possuía o dinheiro, os religiosos lhe apresentaram pessoas na igreja que poderiam lhe emprestar aquela quantia, segundo a versão do autor. Uma das pessoas apresentadas, segundo ele, lhe emprestou R$ 385,5 mil, paulatinamente, mediante emissão de notas promissórias. O valor foi repassado aos religiosos, disse ele. O autor comprometeu-se a efetuar o pagamento ao credor tão logo recebesse o dinheiro do processo judicial.



Acontece que o processo trabalhista resultou em indenização bem menor. Tão logo o credor soube da notícia, encaminhou os títulos a protesto, segundo ele.



De acordo com a juíza Érica Navarro, da 6ª Vara Cível de São Paulo, não há prova de que tais fatos tenham realmente ocorrido. A juíza sentenciou: “inexistindo ato ilícito, indevida, do mesmo modo, a indenização por danos morais, pois a inscrição dos dados do autor nos cadastros de maus pagadores ocorreu por sua própria culpa. Ante o exposto, julgo improcedente o pedido inicial e extingo o processo com julgamento de mérito, nos termos do artigo 269, I, do Código de Processo Civil, (haverá resolução de mérito, quando o juiz acolher ou rejeitar o pedido do autor).”



Leia as sentenças abaixo:



VISTOS. I. EDILSON CESARIO VIEIRA, qualificado nos autos, propôs a presente ação, pelo rito ordinário, em face de IGREJA UNIVERSAL DO REINO DE DEUS, qualificada nos autos, alegando, em síntese, que procurou a ré em um momento de dificuldade em que ele, autor, estava com uma ação tramitando no Poder Judiciário. A ré, então, incentivou-o a realizar um empréstimo no valor de R$1.000.000,00 e repassá-lo a ela a fim de obter êxito em tal ação.



Ocorre que ao término do referido processo o autor somente recebeu R$12.500,00, valor insuficiente para arcar com o seu empréstimo. O título foi levado a protesto e o nome do autor foi maculado.



Alegou ter sido enganado pela ré, que o induziu em erro, aproveitando-se de sua simplicidade e situação financeira e emocional. Requereu a condenação da ré ao pagamento de R$1.582.019,60, valor referente aos empréstimos tomados pelo autor, bem como de R$250.000,00 a título de danos morais.



Requereu os benefícios da justiça gratuita. Atribuiu à causa o valor de R$1.832.019,60. O pedido de justiça gratuita foi deferido a fls 186. Regularmente citado, o réu contestou a ação (fls. 196/251), sustentando, em preliminar, conexão com demanda que tramita na 6ª Vara Cível do Foro Central; ilegitimidade passiva, impossibilidade jurídica do pedido, falta de interesse processual e inépcia da petição inicial.



Não há contrato firmado entre as partes, nem nenhuma prova de que os valores emprestados pelo autor tenham sido entregues à ré. Não cabe a produção de prova testemunhal para provar a existência do contrato em virtude do seu alto valor. Por fim, o cadastro negativo do nome do autor é muito anterior à data dos protestos do empréstimo, não cabendo indenização.



Requereu o reconhecimento da conexão com a ação nº 583.00.2008.115525-6 que tramita na 6ª Vara Cível do Foro Central, bem como a improcedência da ação. Réplica a fls. 267/282, em que o autor refutou os argumentos do requerido. A fls. 345, foi afastada a alegação de conexão, bem como deferida a juntada como prova emprestada a realizada na ação nº 583.00.2008.115525-6 que tramita na 6ª Vara Cível do Foro Central. Encerrada a instrução (fls. 448), as partes reiteraram suas anteriores manifestações.



É o relatório. II.



Fundamento e DECIDO.



A alegação de conexão foi afastada, sem notícia de recurso. Quanto às preliminares, as matérias arguidas não dizem respeito a condições da ação e inépcia da petição inicial, mas ao mérito analisado a seguir. No mérito, sustenta o autor que subscreveu as notas promissória de fls. 27/31, nos valores de R$350.000,00, R$500.000,00, R$100.000,00 e R$50.000,00, em favor de José Américo Potenza, em virtude de empréstimos recebidos pelo requerente.



Alega o autor que os pastores e bispos da requerida o incentivaram a obter empréstimos dos referidos valores, com a enganosa promessa de que obteria solução satisfatória em ação indenizatória proposta no Foro Regional do Tatuapé, bem como que os valores obtidos pelo autor foram repassados aos bispos e pastores da igreja, “para que estes por meio de “campanhas religiosas” e vigílias orassem para que o autor obtivesse êxito na demanda judicial nos moldes esperados” (fls. 07).



Em que pese a argumentação do autor, não restou provado que os valores dos empréstimos tenham sido doados ou entregues a outro título aos pastores e bispos da igreja requerida. Igualmente, não consta que tenha pago nenhum dos valores constantes nas notas promissórias de fls. 27/31.



Ao contrário, ao ser ouvido perante a 6ª Vara Cível do Foro Central (prova emprestada), JOSÉ AMÉRICO POTENZA afirmou que o autor lhe solicitou diversos empréstimos, que totalizam no máximo R$4.000,00 e que a testemunha nunca o cobrou (fls. 339). Negou que os pastores da igreja induzissem os fiéis a contraírem empréstimos para pagamento do dízimo, mas não soube informar se o autor foi induzido a contrair o empréstimo ou se ele efetuou alguma doação para a igreja. Negou que tivesse exigido a assinatura pelo autor de notas promissórias (fls. 340).



Em seu depoimento pessoal, o autor afirmou que os Bispos Edir Macedo e Romualdo Pancero disseram ao depoente que ele deveria fazer uma doação de cinco mil reais, para poder obter a procedência de uma ação indenizatória, em que receberia doze milhões de reais. Inicialmente, não soube esclarecer o valor dos empréstimos recebidos (fls. 366).



Posteriormente, alegou que recebeu um milhão de reais do Sr. Américo, com garantia verbal dada pelo Bispo Edir Macedo (fls. 370) e não sabia se as pessoas que lhe emprestaram dinheiro tinham ação contra o autor (fls. 372). Depois de responder a outras perguntas, afirmou que “o Potenza não emprestou um milhão. Trinta mil ele me deu. O resto em dei pro Edir Macedo” (fls. 375).



A testemunha EMMANUEL JEFFERSON MARINHO DA SILVA relatou que, ao tomar conhecimento de empréstimos realizados pelo autor, o orientou a não fazê-lo (fls. 414). Negou que os empréstimos fossem em benefício da igreja (fls. 415/416).



JOSÉ DOS SANTOS FILHO afirmou que também emprestou dinheiro ao autor, mas muito inferior ao valor das promissórias por ele assinadas. Negou que o dinheiro emprestado fosse endereçado à igreja requerida ou seus representantes (fls. 425/439). Nenhuma das outras testemunhas ouvidas (fls. 341/342 e 395/409) presenciou o autor efetuar os empréstimos descritos na petição inicial, nem a doação à igreja ou seus pastores e bispos. Não há provas de que os valores do empréstimo estejam sendo cobrados judicial ou extrajudicialmente do autor, nem de que ele tenha efetuado qualquer pagamento. Ressalte-se que é ônus do autor a prova dos fatos constitutivos de seu direito. No presente caso, apesar de ter assinado as notas promissórias de fls. 27/31, não há provas de que tenha recebido o valor constante nos mencionados títulos, nem de que tenha doado referido montante a bispos e pastores da requerida.



Sequer há prova, como já frisado, de que tenha sido cobrado pelo credor, José Américo Potenza. Assim, não há que se falar em danos sofridos pelo autor, nem em indenização a ser paga pela ré, sendo de rigor a improcedência da ação.



III. Diante do exposto e do mais que dos autos consta, JULGO IMPROCEDENTE a ação, nos termos do art. 269, inciso I, do Código de Processo Civil. Pela sucumbência, o autor vencido arcará com as custas, despesas processuais e honorários advocatícios, que fixo por equidade em R$3.000,00, nos termos do artigo 20, § 4º, do Código de Processo Civil. Para execução das verbas da sucumbência, o exeqüente deverá comprovar a cessação da situação de pobreza, nos termos dos artigos 11 e 12 da Lei nº 1.060/50. Para fins de recurso, mantenho o valor atribuído à causa, nos termos da Lei Estadual nº 11.608/2003.



Fonte: http://www.conjur.com.br/2011-set-30/fiel-disse-enganado-universal-nao-ganha-indenizacao

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